O chef de cozinha e apresentador Edu Guedes, de 50 anos, passou por uma cirurgia no último sábado (5), em São Paulo, para retirada de um tumor no pâncreas. O diagnóstico veio após uma crise renal que o levou a realizar exames mais detalhados. O caso reacendeu o alerta sobre um tipo de câncer que, embora raro, é extremamente agressivo e costuma ser detectado tardiamente.
Segundo especialistas, o câncer de pâncreas representa apenas 3% dos tumores sólidos, mas está entre os mais letais. “Apesar de não ser tão frequente, o prognóstico costuma ser ruim”, explica o oncologista Stephen Stefani, do grupo Oncoclínicas.
Localizado na parte superior do abdômen, atrás do estômago, o pâncreas tem funções fundamentais no corpo: ele produz hormônios como a insulina e enzimas digestivas. O câncer no órgão surge quando as células pancreáticas sofrem mutações e passam a se multiplicar de forma descontrolada, muitas vezes atingindo outros órgãos — processo conhecido como metástase.
De acordo com o oncologista Elge Werneck, os principais tipos de câncer pancreático são o adenocarcinoma, que é o mais comum e agressivo, e os tumores neuroendócrinos, menos frequentes e, em muitos casos, menos agressivos.
Sinais que geralmente aparecem tarde
Uma das maiores dificuldades no combate à doença está no diagnóstico. Em geral, o câncer de pâncreas não apresenta sintomas específicos nos estágios iniciais. Quando os sinais surgem, o tumor já costuma estar em fase avançada.
Entre os sintomas mais comuns estão:
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Dor persistente no abdômen
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Perda de peso sem causa aparente
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Fraqueza
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Falta de apetite
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Icterícia (amarelamento da pele e dos olhos)
“É um câncer traiçoeiro, pois os sintomas aparecem quando já houve comprometimento de outros órgãos”, explica Stefani.
Quem está mais vulnerável?
Diversos fatores aumentam o risco de desenvolvimento da doença:
Werneck ressalta que mesmo pessoas sem esses fatores podem desenvolver o câncer pancreático, mas a presença deles eleva significativamente o risco.
O cirurgião Rodrigo Surjan, do Hospital Nove de Julho, também destaca um aumento nos casos entre adultos jovens, entre 25 e 40 anos. “Antes era quase exclusivo de idosos. Hoje, embora ainda incomum em jovens, o número de diagnósticos nessa faixa etária tem crescido, possivelmente devido a má alimentação e obesidade”, avalia.
Como é feito o diagnóstico?
O diagnóstico costuma envolver exames de imagem — como tomografia, ressonância magnética e PET-CT — e é confirmado por biópsia. Um exame de sangue chamado CA 19-9 também pode ser solicitado, mas não é conclusivo. Há casos de pacientes com esse marcador normal que têm a doença, e o inverso também ocorre.
Opções de tratamento
A principal forma de tratamento, quando possível, é a cirurgia, geralmente associada à quimioterapia. No entanto, a operação só é indicada quando o tumor está localizado e não invadiu vasos sanguíneos ou outros órgãos.
Nos casos mais avançados, a quimioterapia pode ser feita isoladamente ou combinada com radioterapia. Ainda não há consenso sobre a ordem ideal do tratamento: alguns estudos sugerem melhores resultados quando a cirurgia vem antes da quimioterapia, mas a decisão depende do tipo e estágio do tumor.
Tipos de cirurgia
A abordagem cirúrgica varia conforme a localização do tumor no pâncreas:
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Cabeça do pâncreas: é feita a gastroduodenopancreatectomia, que remove parte do estômago, o duodeno e as vias biliares, exigindo uma complexa reconstrução do sistema digestivo. A cirurgia pode durar de 4 a 10 horas.
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Corpo ou cauda do pâncreas: nesse caso, realiza-se a pancreatectomia corpo-caudal com esplenectomia, que envolve a retirada da parte afetada do pâncreas e do baço. É menos complexa, com duração média de 3 a 4 horas.
Novas perspectivas no tratamento
Embora o câncer de pâncreas ainda represente um desafio para a medicina, novas estratégias estão em desenvolvimento. Imunoterapias, terapias-alvo e até vacinas personalizadas têm mostrado avanços promissores. O objetivo é ensinar o sistema imunológico a reconhecer e combater as células cancerígenas, algo que esse tipo de câncer costuma evitar com facilidade.
É possível viver sem o pâncreas?
Sim. Em casos extremos, pode ser necessário remover todo o pâncreas. Nesses casos, o paciente precisa de reposição hormonal (como insulina) e enzimas digestivas pelo resto da vida.
“Tenho pacientes que fizeram pancreatectomia total e vivem bem, com acompanhamento contínuo”, afirma o cirurgião Rodrigo Surjan.
O caso de Edu Guedes joga luz sobre uma doença muitas vezes invisível até que seja tarde demais. O conhecimento dos sintomas, fatores de risco e possibilidades de tratamento é essencial para aumentar as chances de um diagnóstico precoce — que, em casos como esse, pode ser decisivo.
“O câncer de pâncreas é uma das doenças mais desafiadoras da oncologia. Mas informação salva vidas. Quanto mais cedo for descoberto, maiores são as chances de sucesso no tratamento”, conclui Stefani.