Atraso no diagnóstico, erros médicos e dificuldades no acesso a exames são desafios frequentes enfrentados por pessoas negras no sistema de saúde. Para lançar luz sobre essa realidade, o curta-metragem Corpo Negro estreou na última terça-feira (1º), com uma exibição seguida de debate no Cinema Estação, no Shopping da Gávea, Rio de Janeiro. Disponível online, o filme retrata a jornada de um homem negro lidando com a negligência de profissionais de saúde.
Pesquisas já demonstraram a disparidade racial no atendimento médico. Em 2018, um estudo da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) apontou que mulheres negras tinham o dobro de chances de receber um diagnóstico tardio de câncer de mama em comparação com mulheres brancas. Os dados foram publicados na Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia.
Outro levantamento, divulgado em 2023, revelou que pacientes negros são mais propensos a serem hospitalizados devido a erros médicos em quase todas as regiões do Brasil – com exceção do Sul. De acordo com um boletim do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (Ieps) e do Instituto Çarê, a análise de mais de 66 mil internações entre 2010 e 2021 mostrou que, no Sudeste, o risco é 65,2% maior para pessoas negras, enquanto no Nordeste esse índice salta para 585,3%.
Ainda em 2023, um estudo conduzido pelo Ministério da Saúde e pela Fiocruz constatou que a mortalidade materna entre mulheres negras é mais que o dobro da observada entre mulheres brancas. A pesquisa analisou óbitos ocorridos até 42 dias após a gestação e relacionados a complicações no parto e puerpério.
Nos Estados Unidos, levantamentos apontam tendências semelhantes. Um estudo do Centro Médico de Boston revelou que pacientes negros recebem, em média, o diagnóstico de Alzheimer aos 72,5 anos – quase cinco anos mais tarde que os brancos, cuja média é de 67,8 anos. Além disso, exames como ressonância magnética, essenciais para confirmar a doença, são solicitados com menos frequência para pacientes negros, evidenciando falhas no diagnóstico precoce.
Representatividade na Medicina ainda é baixa
O curta-metragem Corpo Negro também destaca dados alarmantes sobre a falta de diversidade na Medicina. Segundo o Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 75,5% dos médicos formados no Brasil se declararam brancos, enquanto apenas 2,8% se identificaram como pretos. O filme ainda ressalta a contradição de que, apesar da baixa representatividade, corpos negros são os mais utilizados em estudos anatômicos nos cursos de Medicina.
Para transformar esse cenário, o Mediversidade propõe ações concretas, incluindo cursos gratuitos de letramento étnico-racial para estudantes e profissionais da área da saúde, ampliação das políticas de cotas na contratação de professores, revisão curricular para tornar o ensino mais inclusivo, fomento a pesquisas sobre diversidade, oferta de bolsas integrais para estudantes negros e a adoção de manequins negros em atividades práticas.
Com o lançamento de Corpo Negro e a implementação do Mediversidade, a iniciativa busca não apenas escancarar o racismo na saúde, mas também propor soluções para um atendimento mais igualitário e humano.