Envolver-se em atividades criativas pode ser uma das chaves para manter o cérebro jovem por mais tempo. É o que revela um estudo internacional publicado na revista científica Nature Communications, que analisou dados cerebrais de mais de 1.400 pessoas em 13 países.
Os resultados mostraram que indivíduos que praticam regularmente atividades como dança, música, pintura, canto ou jogos eletrônicos apresentam um envelhecimento cerebral mais lento, com conexões neurais mais eficientes.
“Não é que o cérebro rejuvenesça, mas ele envelhece de forma mais lenta”, explica o neurologista Renato Anghinah, professor da Universidade de São Paulo (USP) e um dos autores do estudo. “Essas pessoas mantêm a capacidade de resposta, aprendizado e criatividade por mais tempo.”
Como o estudo foi conduzido
Os pesquisadores utilizaram modelos computacionais chamados brain clocks (“relógios cerebrais”) para comparar a idade biológica e cronológica do cérebro.
Entre os grupos analisados — dançarinos, músicos, artistas visuais, jogadores e pessoas sem atividades criativas —, o padrão foi claro:
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Quem se envolvia com práticas criativas tinha cérebros mais jovens.
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Os “não praticantes” mostraram o envelhecimento esperado.
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Já os iniciantes apresentaram melhorias perceptíveis após poucas semanas.
O destaque ficou para os dançarinos de tango, cujos cérebros pareciam até sete anos mais jovens do que a idade real.
“A dança é uma atividade completa: envolve coordenação, ritmo, improviso e emoção. Tudo isso estimula diversas áreas cerebrais simultaneamente”, explica Anghinah.
Criatividade como política de saúde
Para o neurologista, o estudo reforça a importância das artes como parte das políticas públicas de saúde e educação.
“A arte sempre foi vista como algo opcional, mas ela é essencial. Deve ter o mesmo peso que o exercício físico ou a alimentação equilibrada. Criatividade é saúde mental e cognitiva”, defende Anghinah.
Ele também destaca que escolas — públicas e particulares — deveriam manter o ensino de música, teatro e artes como componentes fixos do currículo.
Nunca é tarde para começar
Mesmo quem nunca teve contato com atividades artísticas pode se beneficiar. O estudo mostrou que começar após os 50 ou 60 anos ainda traz resultados positivos e mensuráveis.
“Aprender a cantar, tocar um instrumento ou até jogar videogames que exigem atenção e raciocínio cria novas conexões e reativa redes antigas do cérebro. A neuroplasticidade funciona até o fim da vida”, destaca o pesquisador.
Imagem gerada com IA
Criatividade no dia a dia
Segundo Anghinah, o segredo é começar pequeno e escolher algo que desperte prazer e curiosidade:
“Cantar, cozinhar de forma diferente, fazer crochê, pintar, desenhar ou jogar games estratégicos — tudo isso mantém o cérebro ativo”, orienta.
“A criatividade é um exercício de liberdade mental. Não depende de talento, mas de curiosidade e constância”, resume o neurologista.
Um novo olhar sobre envelhecer
Os autores acreditam que, no futuro, a criatividade poderá ser usada como ferramenta preventiva, ao lado da boa alimentação, do sono e da atividade física.
“O envelhecimento cerebral é resultado de uma soma de fatores. Agora sabemos que a criatividade também é um protetor importante”, conclui Anghinah.
Ele confessa que o próprio estudo o inspirou pessoalmente:
“Sempre fui muito racional, voltado à pesquisa. Mas depois desse trabalho, voltei a cantar e redescobri o prazer da criação. Até o pesquisador sai transformado”, brinca.