Durante anos, o omeprazol foi um dos medicamentos mais populares do país. Conhecido como “protetor gástrico”, era usado rotineiramente por milhões de pessoas, muitas vezes sem prescrição médica. No entanto, a visão dos especialistas sobre ele mudou.
Hoje, médicos alertam que o uso contínuo do omeprazol — e de outros medicamentos da mesma classe — pode trazer riscos à saúde.
“O uso prolongado interfere na absorção de nutrientes e aumenta o risco de complicações. A recomendação atual é utilizar pelo menor tempo possível e sempre com acompanhamento médico”, explica Débora Poli, gastroenterologista do Hospital Sírio-Libanês.
Esses medicamentos pertencem à classe dos inibidores da bomba de prótons (IBPs), responsáveis por reduzir a produção de ácido no estômago. Além do omeprazol, fazem parte da categoria o pantoprazol, esomeprazol e lansoprazol.
Riscos do uso contínuo
De acordo com Karoline Soares Garcia, gastroenterologista da Clínica Sartor e membro da Federação Brasileira de Gastroenterologia, o uso prolongado do omeprazol pode prejudicar a absorção de ferro, cálcio, magnésio e vitamina B12, o que pode levar a anemia, fraqueza, cãibras e enfraquecimento dos ossos.
O remédio também pode aumentar o risco de infecção intestinal por Clostridioides difficile, bactéria que causa diarreia grave, além de favorecer o crescimento excessivo de bactérias no intestino delgado (SIBO). Há ainda estudos que relacionam o uso prolongado dos IBPs com doença renal crônica e fraturas ósseas.
“Esses riscos não significam que o remédio é perigoso, mas sim que deve ser usado com responsabilidade e pelo tempo indicado”, destaca Garcia.
Quando o omeprazol é realmente necessário
Apesar dos alertas, os especialistas ressaltam que o medicamento continua sendo essencial em muitos tratamentos.
“Ele é indicado em casos de refluxo gastroesofágico, gastrite, úlceras e infecção por Helicobacter pylori. É um remédio acessível e muito eficaz”, afirma Débora Poli.
Há situações em que o uso contínuo é necessário, como em pacientes com esôfago de Barrett, esofagite eosinofílica ou pessoas que fazem uso prolongado de anti-inflamatórios. Nesses casos, a avaliação do médico é indispensável para determinar o tempo de uso.
Substituições e alternativas
Para pacientes com sintomas leves ou ocasionais, há opções menos agressivas.
“Em casos leves, é possível usar o remédio sob demanda, reduzir a dose ou substituí-lo por bloqueadores H2, como a famotidina”, explica o oncologista Raphael Brandão, diretor da Clínica First.
Os bloqueadores H2 atuam de forma diferente, controlando a acidez estomacal com menor impacto no organismo. Outra alternativa é o P-CAB, como a vonoprazana, um novo tipo de antiácido com ação rápida e prolongada. “Apesar de eficaz, ainda é uma opção cara e pouco disponível no Brasil”, acrescenta Brandão.
Mudanças de hábitos fazem diferença
Os médicos reforçam que muitas pessoas poderiam controlar o refluxo e outros desconfortos sem o uso contínuo de remédios.
“Perder peso, evitar deitar logo após as refeições, reduzir o consumo de álcool, café e alimentos ultraprocessados, e elevar a cabeceira da cama são atitudes que ajudam bastante”, explica Brandão.
Débora Poli acrescenta que a rotina alimentar também influencia: “Comer devagar, mastigar bem e respeitar horários regulares pode ser tão eficaz quanto o medicamento em casos leves.”
Um novo olhar sobre um velho remédio
O atual movimento médico não busca demonizar o omeprazol, mas sim resgatar o uso racional de um medicamento que, por anos, foi usado sem critério.
“O omeprazol foi um grande avanço da medicina moderna e continua sendo valioso. O problema é o uso indiscriminado, sem acompanhamento e sem tempo definido”, conclui Karoline Soares Garcia.