Com o início do plantio da safra 2025/2026, o campo mato-grossense sente os reflexos das mudanças no novo Plano Safra. Embora o Governo Federal tenha anunciado o maior volume de recursos da história, a redução da subvenção ao crédito rural e o aumento das taxas de juros têm dificultado o acesso dos produtores ao financiamento necessário para custeio e investimento.
A situação preocupa a Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT), que tem recebido uma série de relatos de agricultores enfrentando obstáculos na obtenção de crédito. Segundo o diretor administrativo da entidade, Diego Bertuol, o montante anunciado não tem se convertido em crédito efetivo nas agências bancárias.
“Os recursos não estão chegando ao produtor. Já estamos com o plantio iniciado e muitos ainda não conseguiram aprovar operações de custeio. A armazenagem é outro gargalo: mais da metade da safra mato-grossense ainda não tem local adequado para estocagem. Precisamos de linhas com juros compatíveis e prazos de carência mais longos, o que não está sendo ofertado”, afirmou Bertuol.
De acordo com o Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (Imea), a produção de soja no estado deve ultrapassar 47 milhões de toneladas nesta safra, enquanto a capacidade estática de armazenagem soma 53,4 milhões de toneladas — volume que também precisa abrigar o milho, cuja colheita anterior superou 54 milhões de toneladas. O resultado é um déficit de mais de 52 milhões de toneladas, evidenciando a falta de infraestrutura.
Infraestrutura precária e custos elevados
O vice-presidente da Aprosoja-MT, Luiz Pedro Bier, reforça que Mato Grosso é o estado mais afetado pela falta de armazéns e pela dificuldade de financiamento.
“Temos uma das piores relações entre produção e capacidade de armazenamento do país. Construir armazéns é caro, o crédito é burocrático e, com os juros atuais, inviável. Pequenos e médios produtores são os que mais sofrem. Muitos recorrem a silos bolsa e enfrentam a falta de caminhões e o alto custo do frete durante a colheita”, relatou.
Embora o Plano Safra preveja o Programa para Construção e Ampliação de Armazéns (PCA), produtores afirmam que os recursos não têm sido liberados na ponta, comprometendo o avanço das obras e aumentando o risco de gargalos logísticos na próxima colheita.
“Não se trata apenas de um problema do produtor, mas de segurança alimentar nacional. Se houver uma crise logística ou portuária, o Brasil pode ficar sem condições de escoar sua safra. Sem espaço para armazenar, podemos perder parte significativa da produção, o que geraria prejuízos bilionários”, alerta Bier.
Juros altos e desestímulo ao investimento
O presidente da Aprosoja-MT, Lucas Costa Beber, ressalta que o desafio é nacional. Ele aponta que, enquanto o Brasil colheu 350 milhões de toneladas de grãos, o déficit de armazenagem supera 120 milhões de toneladas, e o crescimento da produção tem sido mais rápido do que o ritmo de construção de novas estruturas.
“Com juros altos e menos recursos disponíveis no Plano Safra, fica ainda mais difícil investir. O custo dos equipamentos e das obras subiu, afastando os produtores, especialmente os de menor porte”, destacou Beber.
O dirigente defende políticas públicas de incentivo e benefícios fiscais para quem investir em infraestrutura própria.
“O governo precisa criar estímulos fiscais para quem constrói armazéns. Isso é soberania nacional. Mudanças de mercado ou crises globais podem nos obrigar a armazenar mais, e sem estrutura, ficamos vulneráveis”, concluiu.
Risco à competitividade e à soberania alimentar
Com a produção mato-grossense em expansão, o déficit de armazenagem torna-se um problema estratégico. A falta de infraestrutura reduz a autonomia do produtor, pressiona os custos logísticos e diminui a competitividade do país no mercado internacional.
A Aprosoja-MT reforça a necessidade de linhas de financiamento mais acessíveis, com prazos longos, menos burocracia e juros compatíveis com a realidade rural, para destravar investimentos considerados essenciais à sustentabilidade da produção e à segurança alimentar nacional.