Entre as ações previstas está a criação de uma plataforma de autoexclusão, que deve entrar em funcionamento no dia 10 de dezembro. A ferramenta permitirá que o usuário solicite o bloqueio de seu CPF nos sites de apostas, impedindo novos cadastros e restringindo o recebimento de publicidade. O objetivo é reduzir estímulos e facilitar a interrupção do comportamento compulsivo.
Observatório e monitoramento
O acordo interministerial inclui ainda o Observatório Brasil Saúde e Apostas Eletrônicas, uma estrutura permanente de troca de informações entre as pastas. A iniciativa pretende mapear comportamentos, identificar padrões de dependência e acionar redes de cuidado do SUS para atendimento dos usuários.
“O que queremos é localizar as pessoas em sofrimento e oferecer apoio antes que o problema se agrave. Teremos dados que nos permitem identificar comportamentos compulsivos e agir preventivamente”, afirmou o ministro da Saúde, Alexandre Padilha.
Plano de cuidado e atendimento
Além da ferramenta de autoexclusão, o governo vai ampliar orientações sobre como buscar ajuda e onde acessar serviços do SUS, por meio do aplicativo Meu SUS Digital e da Ouvidoria.
Também foi lançada a Linha de Cuidado para Pessoas com Problemas Relacionados a Jogos de Apostas, que organiza protocolos clínicos e prevê atendimento presencial e remoto, com foco em reduzir barreiras de acesso ao tratamento em saúde mental.
Uma das novidades é a oferta de teleatendimento especializado em saúde mental direcionado a casos de dependência de jogos. A medida será implantada em parceria com o Hospital Sírio-Libanês, com previsão de início em fevereiro de 2026. Ao menos 450 atendimentos online serão realizados mensalmente, com possibilidade de ampliação conforme a demanda.
Segundo o Ministério da Saúde, o atendimento remoto será integrado à rede do SUS e poderá encaminhar os pacientes para serviços presenciais quando necessário.
Regulamentação e proteção
Durante o evento, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ressaltou que, embora as apostas tenham sido legalizadas em 2018, a regulação só começou a ser estruturada recentemente.
“O país precisava definir tributação, regras de propaganda e protocolos de jogo responsável. Muito do que era fundamental para proteger as pessoas e coibir abusos não foi regulamentado na gestão anterior”, disse.
Haddad destacou ainda que, com o novo conjunto de regras, cadastros em sites de apostas ficam proibidos para CPFs de crianças, beneficiários do Bolsa Família e do BPC.
Crescimento dos transtornos
O avanço do problema já é perceptível nos dados do SUS. Segundo o diretor do Departamento de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas, Marcelo Kimati, o sistema público registrou 2.262 atendimentos relacionados à compulsão por jogos em 2023. Em 2024, foram 3.490, um aumento de mais de 50%.
Entre janeiro e junho de 2025, 1.951 novos atendimentos já haviam sido contabilizados.
A análise desses registros aponta um perfil predominantemente masculino, de 18 a 35 anos, negro, em situação de vulnerabilidade social e com ruptura de vínculos familiares ou de trabalho. “É um grupo que vive sob forte pressão emocional e que muitas vezes não tem rede de apoio”, ressaltou Kimati.
Desafio em expansão
Com uma indústria bilionária, propagandas intensivas e fácil acesso via celular, o vício em apostas cresce em ritmo acelerado no país. O governo aposta que o conjunto de ações — prevenção, monitoramento, regulação e cuidado — possa conter parte dos danos e garantir alternativas de tratamento para quem já enfrenta o problema.
As equipes responsáveis pelo acordo afirmam que o desafio não se resume ao prejuízo financeiro, mas envolve sofrimento psíquico, endividamento e perda de vínculos sociais — um problema que, cada vez mais, exige respostas rápidas e articuladas do poder público.